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terça-feira, 29 de janeiro de 2013

O IMAGINÁRIO

Há quem pense que o artista é menos importante que o engenheiro. Na verdade, é um julgamento muito difundido. Mas, será ele arguto?
O engenheiro é um profissional do fazer, alguém que atende a demandas muito concretas da sociedade, o mais das vezes soluções para problemas práticos, e a respeito dos quais recai muito pouca dúvida relacionada a ser ou não importante o que se faz. É quase sempre muito clara a importância, a necessidade de uma solução. O artista, por sua vez, figura como um "fabricante de perfumes" junto ao grosso da sociedade, alguém supérfluo, só admirável em situações de tranquilidade, seja econômica, seja política.
Pois bem. Ocorre que o que o engenheiro executa, frequentemente, surge como resposta a uma aspiração que necessariamente se origina no imaginário, seja de um indivíduo, seja coletivo. Só parte das ações do engenheiro se origina na consciência, que é, supostamente, o terreno próprio desse profissional. Inúmeras ações dele vêm do imaginário, sobretudo o aspecto global delas.
O imaginário é o nosso respirar, é nosso pulmão. Nele vêm parar as significações, ainda que mínimas, de nossa realidade, e nele essas significações são trabalhadas, reelaboradas, gerando as classes de que nos servimos para conhecer o que nos cerca, e também - talvez principalmente - nossos sonhos, nossas fantasias, e muitos de nossos lenitivos para as dores que a existência nos impõe.
Ora, o artista é um ativista do imaginário, alguém que se incumbe de enriquecer, problematizar, estender, dinamizar o material do imaginário. O artista cria necessidades, e cria interpretações que atuam muito profundamente na psique dos indivíduos que travam contato com a arte dele, podendo levá-los a uma situação de paz interior e/ou clarividência para o agir, ou, algumas vezes, a uma situação de desespero, que pode mesmo culminar no suicídio.
Então cabe perguntar: será que o artista é mesmo tão desimportante assim?
  

sábado, 26 de janeiro de 2013

UM POUCO DE QUEM RALA...

Acabo de ver a entrevista com o Rubens Figueiredo, no Umas palavras do Canal Futura.
Professor de Ensino Básico no Rio (há 25 anos), tradutor (já traduziu mais de 70 livros, em pouco mais de 30 anos de "carreira"), romancista e contista, Rubens parece ser, essencialmente, um artífice e um "carregador de piano" da literatura, um trabalhador literário. Ele mesmo diz que seu trabalho como "criador" ocorre nas suas horas vagas, porque na maior parte do tempo é preciso ganhar a vida, é preciso cumprir com as responsabilidades. Que lição para mim, que tenho tempo de sobra, e o passo quase todo lendo...
Preciso escrever mais. Preciso trabalhar, batalhar mais.

A propósito: seu último livro se chama Passageiro do fim do dia, e saiu em 2010 pela Companhia das Letras.

domingo, 20 de janeiro de 2013

ANNA KARIÊNINA

Tolstói era, de fato, um enorme, um extraordinário psicólogo. Seu livro é um exame minucioso da alma de figuras condenadas socialmente, sobretudo a personagem que dá título ao livro. Ao lê-lo, fui me sentindo pequeno como escritor. Serei eu capaz, nalgum futuro, de produzir um estudo tão verdadeiro e profundo quanto Anna Kariênina?...
Minha resposta, no momento, é não, e isso não é mau. Não se deve imitar ninguém, ao criar. E minha alma é realmente em muito oposta à de Tolstói. Ele é um analista, e eu sou sintetizante. Isso, esse pensamento, muito me alivia, porque saio da leitura de Anna me sentindo como um barquinho de papel arrastado pela correnteza que a chuva produz à beira de uma calçada, chuva e correnteza que são, a um só tempo, Liev Tolstói.
Até as "revoltas" modernistas, ninguém escreveu como Tolstói, ninguém foi tão longe, tão exato, ninguém problematizou nem representou tão bem quanto ele.
É, sem dúvida, o grande mestre do Séc. XIX. Esse devia ser seu sobrenome.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

RAÍZES DO BRASIL

Acabo de ler, pela terceira vez, o livro de Sérgio Buarque de Holanda, e venho aqui escrever no blog cheio de entusiasmo por esse marco na historiografia brasileira. Sérgio emprega conceitos weberianos, especialmente o de tipo ideal, no exame da materialidade, da especificidade da colonização portuguesa na América, assim como do desdobramento pós-independência dessa empresa, e o faz de maneira tão profícua  e esclarecida, que uma visão clara e coerente de nossa sociedade é oferecida ao leitor atento (no meu caso, razoavelmente atento). E mais: ele identifica um processo revolucionário a longo prazo em curso, aqui, a partir do séc. XIX, e que ainda não havia culminado quando da escrita do livro (1936). Trata-se de um processo de consolidação de uma sociedade liberal-democrática (creio que ele, o processo, está hoje corrompido, mas... é caso para outro post), algo desenvolvido espontaneamente, sutilmente, década após década, desde, acredito, a chegada da família real em 1808. Talvez fosse o caso de uma "visitinha" (sabe Deus de quem) agora por esses dias...
 

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

APRENDENDO COM TOLSTOI, E O XIX...

Anna Kariênina e o XIX estão me ensinando muito. Sim, estou lendo o livro de Tolstói.
Como ele vai fundo na alma, sem grandes virtuosismos de linguagem! Suas imagens são às vezes até simplórias, e muitas vezes nada originais, mas isso, é incrível, não pesa nada contra ele.
Anna Kariênina parece ser uma catedral (como Proust quis que a Recherche fosse...), só que construída à base de madeira e couro de renas.
Mas... ainda não terminei. Vejamos o que nos aguarda. Postarei aqui mais comentários.

domingo, 6 de janeiro de 2013

ATITUDE DE ARTISTE

Certo executivo de uma editora não muito grande aqui do Brasil produziu, recentemente, uma pérola que dizia mais ou menos assim: "O problema é que os escritores brasileiros escrevem para os amigos, escrevem para ganhar o Nobel, e não para vender".
Ora, ora. Me parece óbvio que num país sério o escritor artiste, aquele que escreve pensando principalmente na qualidade dos seus escritos, na sua originalidade, na sua perspicácia e acuidade quanto ao que nos faz humanos, esse escritor deveria vender mais que aquele que explora nichos, preconceitos, vulnerabilidades diversas, do mercado e do público leitor, com o intuito claro de fazer dinheiro. Estarei errado? Será o certo a segunda opção?
Claro, a situação atual desespera quem quer a qualidade, situação em que vingam venenos alegadamente doces de escorpião e muitos tons de cinza, mas... o escritor dotado realmente de ideias e de boa-vontade deve, penso eu, abraçar a causa da educação do público leitor (por mais desprezível que seja a verticalidade inerente a essa atitude). Isso implica muita batalha, sobretudo de... marketing. Sim, marketing.
Se fizermos um bom trabalho nessa esfera, creio que com o tempo os autores de qualidade venderão mais e mais.
É uma esperança. De artiste.